No final do ano de 2016, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) divulgou um manual de orientação para médicos, pais, educadores, crianças e adolescentes, com o foco na “Saúde de Crianças e Adolescentes na Era Digital”.
Neste manual, foram abordados os principais problemas ligados ao uso excessivo da tecnologia por crianças e adolescentes. Entre as consequências, estão o aumento da ansiedade, a dificuldade de estabelecer relações em sociedade, o estímulo à sexualização precoce, a adesão ao cyberbullying, o comportamento violento ou agressivo, os transtornos de sono e de alimentação, o baixo rendimento escolar, as lesões por esforço repetitivo e a exposição precoce a drogas, entre outros. Todos com efeitos danosos para a saúde individual e coletiva, com graves reflexos para o ambiente familiar e escolar.
De acordo com a SBP, estudos científicos comprovam que a tecnologia influencia comportamentos através do mundo digital, pela adoçãode hábitos, muitos deles inadequados desde os primeiros anos da infância.
Existem benefícios e prejuízos advindos dessas tecnologias. O desafio é saber usá-las na dose certa. Neste contexto, o pediatra tem um papel central, pois, pelo respeito e confiança que recebe das famílias, pode ser o agente de mudanças ao orientar os pais a agirem diante de cenários de risco.
Devemos sempre programar com as crianças e adolescentes um plano de “dieta midiática” de acordo com as idades e desenvolvimento cognitivo e maturidade. Da mesma forma, é importante orientar as crianças e adolescentes a se protegerem e terem conhecimento e todos os riscos.
A SBP recomenda o desencorajamento do uso da tecnologia durante as refeições, de 1 a 2 horas antes de dormir e a exposição passiva de conteúdos inapropriados para crianças menores de 2 anos.
TEMPO DE TELA
As primeiras orientações do Manual chamam a atenção para o tempo de uso da tecnologia digital, também denominado tempo de tela. Neste contexto, a SBP pede que esse período seja limitado e proporcional às idades e às etapas do desenvolvimento cerebral-mental-cognitivo-psicossocial das crianças e adolescentes.
Além disso, evite ou até proiba a exposição passiva às telas digitais, com acesso a conteúdos inapropriados de filmes e vídeos, para crianças com menos de dois anos, principalmente, durante na hora das refeições ou nas horas que antecedem o sono.
Crianças entre dois e cinco anos também devem ter o tempo de exposição limitado: no máximo uma hora por dia.
Até os seis anos de idade, a orientação é para que as crianças sejam protegidas da violência virtual, “pois não conseguem separar a fantasia da realidade”.
Fazer uso de televisão ou computador nos seus próprios quartos não é recomendado para crianças menores de 10 anos. A orientação visa evitar que as crianças fiquem vulneráveis a conteúdos inapropriados ou, ainda, que tenham acesso facilitado às redes de pedofilia e exploração sexual online, compra e uso de drogas, pensamentos ou gestos de autoagressão e suicídio, além das ‘brincadeiras’ ou ‘desafios’ online que podem ocasionar consequências graves.
Aos adolescentes, a recomendação também é para que não fiquem isolados em seus quartos. Além disso, é preciso equilibrar as horas de jogos online com atividades esportivas, brincadeiras, exercícios ao ar livre ou em contato direto com a natureza.
DIÁLOGO E VIGILÂNCIA
Devemos conversar sobre as regras de uso da internet, sobre o nível de segurança e privacidade e sobre nunca compartilhar senhas, fotos ou informações pessoais ou se expor a pessoas desconhecidas com os nossos filhos. E sempre monitorarmos os sites, programas, aplicativos e vídeos que crianças e adolescentes acessam, visitam ou trocam por mensagens, sobretudo nas redes sociais.
O diálogo sobre valores familiares e regras de proteção social para o uso saudável, crítico e construtivo das tecnologias também deve ser abordado, enfatizando a relevância ética de não postar qualquer mensagem de desrespeito, discriminação, intolerância ou ódio.
Confira abaixo algumas das recomendações da SBP:
PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
Nas telas do mundo digital tudo é produzido como fantasia e imaginação para distrair ou afastar do mundo real – portanto, não se deixe enganar no mundo virtual;
A senha é só sua, não compartilhe sua senha com ninguém, ninguém mesmo! Única exceção apenas para seus pais que são responsáveis por você até completar os 18 anos, legalmente.
Preste atenção para não adicionar qualquer pessoa desconhecida e jamais marque encontros com pessoas estranhas ou conhecidas apenas da Internet e que enviam mensagens solicitando encontros com você!
Cuidado ao utilizar a webcam, evite a exposição se você estiver sem roupas ou mesmo no seu quarto ou sozinho em qualquer lugar;
Seja respeitoso online e trate os outros como gostaria de ser tratado, afinal você merece respeito de todos também. Evite repassar mensagens que possam humilhar, ofender, zombar ou prejudicar a pessoa que recebe este seu recado.
Crescer e construir o seu corpo precisa de horas de sono e alimentação balanceada e saudável. Se você estiver se sentindo cansado, sonolento, com fome ou sem apetite, ou com dor de cabeça, nas costas, nos olhos ou nos ouvidos, desligue o seu celular ou seu computador, converse com seus pais ou consulte seu médico pediatra.
PARA PAIS:
Verificar a classificação indicativa para games, filmes e vídeos e conteúdos recomendados de acordo com a idade e compreensão de seus filhos;
Estabelecer regras e limites bem claros sobre o tempo de duração em jogos por dia ou no final de semana e sobre a entrada e permanência em salas de bate-papo, redes sociais ou durante jogos de videogames online;
Discutir francamente qualquer mensagem ofensiva, discriminatória, esquisita, ameaçadora ou amedrontadora, desagradável, obscena, humilhante, confusa, inapropriada ou que contenha imagens ou palavras pornográficas ou violentas;
Recomendar aos seus filhos que nunca forneçam a senha virtual a quem quer que seja, nem aceitem brindes, prêmios ou presentes oferecidos pela Internet, assim como também jamais ceder a qualquer tipo de chantagem, ameaça ou pressão de colegas ou de qualquer pessoa online;
Lembrar sempre que você como adulto, pai ou mãe, e, com a convivência diária, se torna um modelo de referência para seus filhos. Portanto dar o primeiro exemplo: limite o seu tempo de trabalho no computador, quando em casa. Desconectar e estar presencialmente com seus filhos.
O uso das mídias digitais pelas crianças e adolescentes é permitido, desde que sejam obedecidas regras para utilização e que as atividades ao ar livre, leitura, e socialização com a família não sejam esquecidas!
Notou algum comportamento agressivo, dissociativo entre mundo real e virtual, dependentes da tecnologia, transtorno de sono, higiene, uso de drogas, queda do rendimento escolar, ou prática/apresentação de sinais de cyberbullying ou self-cutting? Marque uma consulta com o Pediatra de sua confiança!
Por. Dra. Laura Machado
Pediatra