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Como ocorre a hipertrofia muscular e quais os efeitos da suplementação com o ácido fosfatídico

A nossa massa muscular esquelética compreende aproximadamente 50% do nosso corpo. Ela é essencial para a locomoção, produção de calor durante períodos de estresse ou frio. A massa muscular também é fundamental para nosso metabolismo basal, ou seja, quanto maior a proporção da massa muscular em relação aos outros tecidos como o adiposo, maior será o nosso metabolismo. O tecido muscular possui um turnover ou uma taxa de síntese/degradação diária que varia de 1% a 2% em indivíduos saudáveis, assim as proteínas do músculo esquelético são continuamente sintetizadas e degradadas. A diferença entre a síntese de proteínas musculares (anabolismo) e a degradação das proteínas musculares é denominado balanço proteico (net protein balance). Portanto, períodos prolongados de um saldo positivo, onde as taxas de síntese proteica são cronicamente superiores à taxa de degradação proteica, estão diretamente relacionados com a hipertrofia muscular. Em contraste, períodos de um saldo negativo (ex: sedentarismo, jejum prolongado, exercícios aeróbicos em excesso, alimentação hipoproteica e hipocalórica), onde as taxas de degradação muscular excedem cronicamente a formação, ocorre depleção de proteínas musculares, manifestando-se como a atrofia muscular que é muito comum nos idosos e sedentários.

Porque ter uma boa massa muscular é importante para termos saúde a longo prazo?

A perda da massa muscular e da força (denominadas sarcopenia e dinapenia, respectivamente) estão associadas com diminuição da capacidade funcional, aumento no risco de quedas, fraturas, incapacidades e doenças metabólicas. De fato, a sarcopenia e as comorbidades associadas diminuem a qualidade de vida e estão intimamente ligados a um maior risco de mortalidade. Portanto, manter uma boa massa muscular por toda a vida é fundamental para compensar a progressão de doenças. Até o momento, o mais efetivo meio para aumentar a massa, força ou compensação do músculo esquelético perdido com o envelhecimento ou por doenças, permanece a musculação ou qualquer exercício de resistência combinado com o consumo adequado de nutrientes.

Assim, a massa muscular esquelética pode ser aumentada através de um programa de exercícios de resistência. A resposta hipertrófica a sobrecarga mecânica pode ser melhorada através de estratégias alimentares, como otimização da ingestão de carboidratos, proteínas e estratégias de suplementação. A nível celular, a sobrecarga mecânica, a ingestão correta de nutrientes, e uso correto dos suplementos esportivos tem como objetivo atuar na ativação da via anabólica pelo complexo da proteína alvo da rapamicina em mamíferos (mTOR). A via mTOR atua como um integrador de sinais celulares e controla a síntese proteica, especificamente no processo de iniciação da tradução de proteínas levando ao aumento

Quais fatores e suplementos podem estimular a hipertrofia muscular?

Várias fatores podem estimular e regular o anabolismo muscular e a via da mTOR, especialmente fatores de crescimento (por exemplo, hormônios como a insulina e o IGF-1 que é o fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1), os hormônios sexuais endógenos como a testosterona e a dihidrotestosterona, a ingesta correta de aminoácidos, os estímulos mecânicos (musculação) e o estado energético. Assim, a regulação da atividade da mTOR por suplementos é algo extremamente estudado. Sabe-se que a leucina (aminoácido de cadeia ramificada) é um importante regulador da atividade anabólica ativando a via mTOR.

Mas existem novas substâncias que podem ajudar na hipertrofia muscular e estudos mais recentes sugerem os efeitos da suplementação com o Ácido Fosfatídico (AF) na ativação da mTOR. Vários alimentos contêm AF, embora em pequenas quantidades. As maiores quantidades de AF foram encontrados em vegetais pertencentes a família Brassicaceae, tais como como repolho (Brassica oleracea) que continha 700 nmol/g (aproximadamente 0,5 mg/g de AF). Mas ensaios com humanos, em treinamento de resistência, têm utilizado suplementos de AF com doses muito maiores variando de 250mg a 750 mg. Assim, a quantidade de AF encontrada na dieta é insignificante com propósitos de ganho de massa muscular sendo encontrada apenas como suplemento.

Como o Ácido Fosfatídico pode favorecer o ganho de massa muscular?

O uso exógeno do AF induz ganho de massa muscular mediado pela mTOR, no entanto essa sinalização é diferente da AF endógena (produzida pelo próprio organismo). O uso dos suplementos com AF favorecem a sinalização através de um mecanismo alternativo pela insulina e os fatores de crescimento, que ativam o mTOR através de um mecanismo dependente de PI3Ks. A fosfoinositídeos 3-quinases (PI3Ks) são uma família de enzimas envolvidas em funções celulares tais como crescimento celular, ou seja, atua no crescimento muscular resultante da ativação da Akt. Por sua vez a Proteína Kinase B (Akt) é necessária para a translocação do transportador de glicose 4 (GLUT4) para a membrana plasmática induzida pela insulina o que resulta em aumento da síntese de glicogênio nos músculos.

Os resultados da suplementação com AF são muito interessantes, estudo publicado em 2012 no Journal of the International Society of Sports Nutrition examinou se a administração de ácido fosfatídico oral poderia aumentar a força, a massa muscular durante um programa de treinamento de resistência por 8 semanas. Nesse estudo dezesseis homens, praticantes de musculação, foram distribuídos aleatoriamente para um grupo que consumia 750 mg de AF ou um placebo. Durante cada sessão de teste, os indivíduos foram avaliados quanto à força e composição corporal: os indivíduos que ingeriram AF demonstraram um aumento de 12,7% na força de agachamento e um aumento de 2,6% na massa muscular, enquanto os indivíduos que consomem placebo mostraram uma melhora de 9,3% na força do agachamento e uma variação de 0,1% na massa muscular. Os resultados deste estudo sugerem que uma combinação de uma ingestão diária de 750mg de AF, combinado com um programa de treinamento de resistência de 4 dias por semana por 8 semanas parece ter um benefício provável na melhoria da força e um benefício real no ganho de massa magra em indivíduos que praticam musculação.

Vale ressaltar que somente a suplementação com AF não traz resultados no ganho de massa muscular, é necessária alimentação e/ou suplementação de aminoácidos + carboidratos e sobrecarga mecânica (musculação). Todos esses itens em conjunto induzem a sinalização mTOR através de mecanismos divergentes de sinalização, ou seja, esses estímulos podem atuar em paralelo e sinergicamente para aumentar o anabolismo muscular e hipertrofia. Jamais faça auto-medicação ou suplementação sem acompanhamento médico especializado.

Referências:

1) Hoffman et al. Efficacy of phosphatidic acid ingestion on lean body mass, muscle thickness and strength gains in resistance-trained men. Journal of the International Society of Sports Nutrition (2012) 9:47.

2) Bond P. Phosphatidic acid: biosynthesis, pharmacokinetics, mechanisms of action and effect on strength and body composition in resistance-trained individuals. Bond Nutrition & Metabolism (2017) 14:12

3) Shad B et al. The mechanistic and ergogenic effects of phosphatidic acid in skeletal muscle. Appl. Physiol. Nutr. Metab. 40: 1233–1241 (2015).

Por: Dr. Guilherme Renke
Médico da Nutrindo Ideais