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Não é só o Glúten! Nova proteína do trigo pode exacerbar resposta imune no organismo.

Quando assunto é o glúten, podemos esperar polêmica e muitas opiniões diferentes. De fato, o glúten é uma proteína amorfa encontrada no trigo, no centeio e na cevada. O mais consumido é o trigo, e nele o glúten é formado, ao contrário do que se pensa, pelo processo de mistura e aquecimento das prolaminas (gliadina e a glutenina) com a água.

O glúten é considerado um dos maiores componentes alimentares que podem deflagrar um sintoma gastrointestinal como mostra o estudo publicado em 2011 no “American Journal of Gastroenterology” diz que “mesmo em pacientes sem doença celíaca, a ingestão do glúten pode causar sintomas gastrointestinais como dor, distensão abdominal, alteração de consistência fecal e cansaço”.

Além dos sintomas gastrointestinais, parece haver uma relação do glúten com o sistema imune a nível global, o que pode explicar a ocorrência de sintomas extraintestinais relacionados com o glúten como: cefaléia, eczema ou rash cutâneo, fadiga crônica, depressão, anemia e dores articulares como mostra o estudo de Sapone e colaboradores publicado em 2012.

Mas… Estudos recentes descobriram que uma outra proteína presente no trigo é capaz de desencadear processo inflamatório o que poderia piorar o quadro de doenças crônicas, como esclerose múltipla, asma e artrite reumatóide. Muitos estudos anteriores foram focados no glúten e seu impacto na saúde digestiva, estas novas pesquisas mudam o foco para uma família diferente de proteínas encontradas no trigo chamadas de inibidores da amilase e da tripsina (ATIs).

O estudo de Schuppan e colaboradores mostra que o consumo de ATIs poderia levar ao desenvolvimento de inflamação em tecidos além do intestino. Evidências sugerem que as ATIs poderiam piorar os sintomas da artrite reumatóide, esclerose múltipla, asma, lúpus e esteatose hepática, bem como na doença inflamatória intestinal. Isso é corroborado pelo estudo recente publicado na prestigiada revista Gastroenterology mostrando que todos os cereais com glúten possuem, de longe, as maiores concentrações de ATI e que quando ingeridas são em grande parte resistentes às proteases e ao calor o que aumenta a inflamação intestinal pela ativação das células mielóides do sistema imune presentes no intestino.

As AITs não compõem mais de 4% de proteínas de trigo, mas podem desencadear potentes reações imunológicas no organismo. O pesquisador, Professor Detlef Schuppan da Universidade Johannes Gutenberg, na Alemanha, explica: “Além de contribuir para o desenvolvimento de condições inflamatórias relacionadas ao intestino, acreditamos que as ATIs podem promover a inflamação de outras doenças crônicas relacionadas ao sistema imunológico fora do intestino. O tipo de inflamação intestinal observada na sensibilidade ao glúten não celíaco difere daquela causada pela doença celíaca, e não acreditamos que isso seja desencadeado exclusivamente pelo glúten. Em vez disso, demonstramos que as ATIs do trigo, que também estão contaminando o glúten comercial, ativam tipos específicos de células imunes no intestino e outros tecidos, potencializando assim os sintomas de doenças inflamatórias pré-existentes.

 Importante lembrar que a restrição nutricional absoluta aos alimentos com glúten quando feita sem indicação ou sem o acompanhamento do médico e do nutricionista deve ser desencorajada. No entanto, os estudos sugerem que pessoas com condições especiais, como portadores de doenças autoimunes poderiam se beneficiar da restrição alimentar ao glúten.

 

Por Dr. Guilherme Renke – Médico pela Universidade Estácio de Sá, com pós-graduação em Cardiologia pelo Instituto Nacional de Cardiologia INCL RJ e Endocrinologia pela IPEMED. Membro da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte, Membro do American College of Sports Medicine, Membro da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Membro do Departamento de Ergometria e Reabilitação da SBC, Médico pós-graduado em endocrinologia e metabologia da Nutrindo Ideais e colunista da página Eu Atleta – Globo.com

 

Referências:

1 – Zevallos VF et al. Nutritional Wheat Amylase-Trypsin Inhibitors Promote Intestinal Inflammation via Activation of Myeloid Cells. Gastroenterology. 2016 Dec 16. pii: S0016-5085(16)35503-2. doi: 10.1053/j.gastro.2016.12.006

2 – Schuppan D et al. Wheat amylase trypsin inhibitors as nutritional activators of innate immunity. Dig Dis. 2015;33(2):260-3. doi: 10.1159/000371476. Epub 2015 Apr 22.

3 – Fasano A, Sapone A, Zevallos V, Schuppan D. Nonceliac glúten sensitivity. Gastroenterology. 2015;148(6):1195-1204

4 – Biesiekierski J et al. Gluten Causes Gastrointestinal Symptoms in Subjects Without Celiac Disease: A Double-Blind Randomized Placebo-Controlled Trial. The American Journal of Gastroenterology 106, 508-514 (2011)  doi:10.1038/ajg.2010.487

5 – Sapone A, Bai JC, Ciacci C, et al. Spectrum of gluten-related disorders: consensus on new nomenclature and classification. BMC Med. 2012;10:13